A campanha pela liberalização do Aborto anda nas ruas. Uns agitam bandeiras a favor do «sim». Outros defendem argumentos pelo «não». Cada um tem o direito de defender a sua posição. Mas penso que há limites. Usar crianças como transportadores de informação pelo «não» é na minha modesta opinião vergonhoso.
Assim vai a campanha...
Travões precisam-se...
Aqui deixo a notícia.
Foram as crianças que levaram os folhetos aos pais. Na passada sexta-feira, os meninos do Jardim de infância Aquário, em Setúbal, chegaram a casa com uma «Carta à minha mãe» dentro das mochilas. O destinatário era a mãe e o pai, lá em casa, já que as crianças ainda estão em idade pré-escolar.
O objectivo do folheto é claro: fazer campanha pelo «não» ao referendo do próximo dia 11 de Fevereiro. A carta, onde uma criança, que não chegou a nascer, escreve à mãe acusando-a de o «matar» circula já por vários colégios das IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social).
«Mãe, como foste capaz de me matar?» e «Como consentiste que me cortassem aos bocados, me atirassem para um balde? (...) Por acaso pensavas comprar uma máquina de lavar ou um aspirador, com os gastos que talvez eu te iria causar?», são algumas das frases que se podem ler neste texto intitulado «Carta à minha Mãe».
Questionado pelo PortugalDiário, o responsável pelo colégio Aquário, o padre Manuel Vieira do Centro Paroquial Nossa Senhora da Anunciada, afirmou que «as circulares chegaram até à paróquia» e foram «distribuídas pelos colégios e pelas crianças». Para o padre Vieira, não há dúvidas que «a obrigação da Igreja é informar» e é esse o único intuito dos folhetos, garante. Contudo, não foi possível apurar qual a origem dos folhetos. «Chegaram cá e nós fizemos publicidade», explicou.
«Cada um é livre de optar, mas a obrigação da Igreja é informar», reitera o pároco, acrescentando que foi «dentro desse espírito» que enviou as circulares às crianças, que tem sob a sua direcção cerca de 750 crianças, em cinco colégios. Um dos pais que recebeu esta «Carta à minha mãe», indignado com o teor do documento, enviou-a para o blogue Kontratempos. Tiago Barbosa Ribeiro, sociólogo, e o autor deste espaço, deu destaque à missiva e acabou por postá-la no
Sim no Referendo, um blogue criado há duas semanas e que irá acabar no dia 11. «O blogue reúne um conjunto improvável de pessoas, da direita à esquerda, que têm um consenso fundamental sobre o referendo».
O sociólogo de 24 anos postou a carta e desde aí recebeu já comentários de outros pais, noutros colégios, que receberam - através dos filhos - uma carta igual. «O blogue é um espaço abrangente e é um contributo importante» para a campanha, garante Tiago Barbosa Ribeiro, que é ainda um dos elementos do movimento «Jovens pelo Sim».
Para Barbosa Ribeiro, a carta «aponta para a falta de decência de algumas acções no não», «de uma campanha suja que está no terreno, longe das câmaras de televisão e dos destaques dos jornais». Contudo, Nuno Godinho de Matos, da Comissão Nacional de Eleições, considera que a atitude não constitui um «ilícito», apesar de ser feita propaganda através de crianças.
O PortugalDiário tentou falar com o presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, mas até ao momento tal não foi possível. Contudo, o PD sabe que no caso de IPSS, o papel do Estado termina no financiamento das instituições, não podendo imiscuir-se nas opções da direcção, a não ser que os estatutos prevejam que a instituição é apartidária. Neste caso, é a Igreja Católica quem dirige a instituição. Também as direcções de cada IPSS gozam de autonomia. Questionado o Ministério da Educação, não foi possível obter uma reacção oficial a este caso.